segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

PaLáVrinhaZinhOna

A m ê n d O a


A chuva branda que insiste em cair traz consigo lembranças de um dia inesquecível que vivi, dia em que pareci experimentar todas as sensações que existem no mundo. Por um instante tentei explicá-las, mas percebi que não era possível, bastava senti-las. Voltei meus olhos para os pés da cama e lá estava! Tão pequeno, porém tão especial - meu nariz de palhaço - por traz daquela cor tão vibrante vejo passar um filme, quando percebo a primeira lágrima brotar em meus olhos e escorrer pelo meu rosto começo a entender. Estava inundada por um sentimento de alegria que incrivelmente me tomava à medida que lembrava deste dia tão especial.
Fecho meus olhos por um instante e começo a me recordar de cada paciente que visitei naquele dia. Aqueles quartos cinzas que a cada novo gesto se coloria, que com a sonoridade de nossas canções se tornavam mais vivos, e que a cada bolha de sabão se resplandecia.
Ah bolhas de sabão!! Únicas em sua beleza, tão majestosas que carregam dentro de si tantos pedidos. O seu flutuar é acompanhado pelo olhar atento da pequena Vitória, que por traz daquele vidro parecia vibrar com a beleza de tantas bolhas, o brilho dos seus olhos, e o sorriso em seus pequenos lábios, se confundia com o esplendor daquelas frágeis bolhas de sabão.
Mas uma lágrima escorre em meu rosto, esta agora descansa sobre minha cama. Lembro-me neste instante das lágrimas chorosas daquela bela moça, que as deixava cair sobre o leito de seu pai, enquanto para ele declamava uma poesia. Era a poesia da caixinha mágica, a caixinha feita para guardar tudo o que não cabe em nenhum outro lugar, para guardar a fé, a esperança, a saúde... e com uma suave gota de tempo ela se fecha com tudo o que leva dentro. Esta caixinha mágica é deixada ao lado do paciente, pois todas as vezes que precisar lembrar daqueles bons sentimentos, basta abri-la.
Assim, em meio as bolhas de sabão eu me despeço, com um até logo. O brilho daquelas bolhas se confundia com o brilho dos olhos daquela bela moça, olhos que nadavam em lágrimas. A sua voz tremula se despedia, estourando as bolhas e fazendo seus breves pedidos, conforme a doutora havia prescrito, - estoure as bolhas e faça seus pedidos, com certeza eles serão realizados -. Aquela delicada voz parece agora soar em meus ouvidos.
Hoje sei que ser um doutor palhaço é muito mais do que simplesmente ser. Quando atravessei aquela porta... derepente toda mágica se acabou... Quem havia roubado as cores daquele lugar? Em segundos pereci experimentar todas as sensações que existem no mundo. Olhei a minha volta, parecia não acreditar, ou na verdade não queria acreditar. Mas já estava ali, dentro da UTI. No sorriso dos enfermeiros buscava força e tranqüilidade para ali permanecer.
Entre tantos leitos e tanto silêncio, tentava buscar o primeiro colorido daquele lugar, pedi então....durma, durma medo meu... Quando olhei para o doutor Gallôtu, que me acompanhava percebi então que nós, nós éramos o colorido daquele lugar.
Em meio a tantas máquinas, tanto cinza, tanto silêncio, cabia a nós colorir aquele lugar. Li nos olhos do meu amigo dr. palhaço – quanta responsabilidade em tão pequenas e inexperientes mãos – Mas aquela pequena máscara vermelha nos permitiu enxergar além, e acalmar nossos medos.
Precisava agora encontrar Mariana. A pedido de uma pessoa que na recepção do hospital encontrei. Ali estava ela!! Quando me aproximei do seu leito... Ah Mariana! Tão jovem, tão frágil e ao mesmo tempo tão forte, parecia estar tão longe e... como é doce a dor da palavra dita de tão longe... Mas o preço é me fazer acreditar que mesmo longe você estava tão perto...
E assim da minha boca começaram a soar palavras, palavras amigas, palavras doces, que tenho certeza que estão guardadas com você. Lembrei então de uma música que carrega seu nome, não pensei duas vezes e comecei a cantá-la....O sol veio avisar que de noite ele seria lua pra poder iluminar Ana o céu e o mar...Ana e o mar, Mariana todo sopro que apaga uma chama reacende o que for pra ficar.... Ah bela Mariana!! Que estas palavras reacendam a chama de sua vida!!!
Ainda misturado ao bipe daquelas máquinas minha voz se despede dos outros pacientes, voz suave que com eles ficará guardado, mesmo distantes tenho certeza que conseguiram nos ouvir, nos sentir, nós estávamos de alguma forma perto, pois ....certo é estar perto sem estar...!
Amêndoa

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